“Você tem certeza que a gente está hospedada aqui mesmo?”
Essa pergunta, Yara e eu nos fizemos por algumas vezes, durante as primeiras horas que chegamos em Barra Grande, no Piauí. O motivo era o nosso estilo de viagem ultra-econômico que estava em ativado, desde a chegada em São Luis do Maranhão, e o espanto com a estrutura do hostel, que tinha custado incríveis R$ 45.
Assim que desembarcamos da van que tinha feito nosso transfer de Parnaíba até lá, ouvimos do motorista que ali era uma excelente hospedagem. Seguimos caminhando, com as nossas mochilas, sem dar muita atenção pra essa frase… Passamos pela entrada da pousada: uma portaria grandiosa, com um corredor de palmeiras oponentes e muito verde. No final, avistamos uma espécie de casa de fazenda, com uma varanda espaçosa, com vários móveis rústicos e modernos dividindo espaço com redes.
Ao entrarmos na recepção, notamos que o pé direito era alto e o bom gosto da decoração vista do lado de fora se mantinha ali dentro também. Depois de trocar algumas palavras com o atendente, virei de costas e vi uma piscina grandiosa, com espreguiçadeiras e bangalôs a nossa frente!
Do outro lado, o jardim continuava com alguns quiosques também grandiosos que funcionavam como redário. Todo o jardim era planejado e muito bem cuidado. O silêncio reinava naquele lugar e não víamos mais nenhum hóspede por ali.
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Yara e eu nos entreolhamos assustadas, enquanto o atendente da recepção tentava localizar a nossa reserva. Foi ai que ele disse a primeira frase que nos trouxe o questionamento à mente. Ele explicou que o sistema da pousada estava oscilando e, por isso, não ia conseguir localizar a nossa reserva. Além disso, tínhamos chegado antes do horário do check-in.
Mesmo assim, ele nos permitiu que usássemos a área comum da pousada/hostel enquanto tentava resolver a situação. Depois de deixarmos as nossas mochilas num canto da recepção, fizemos um rápido raio-x da estrutura e descobrimos ainda que o hostel era pé na areia! Havia uma porta exclusiva de acesso pra praia. Ficamos chocadas com aquela situação porque nunca antes os nossos orçamentos permitiram uma hospedagem desse tipo…
Depois de caminharmos pela praia, resolvemos voltar para o hostel e aproveitar a piscina. O relógio não marcava nem 10h e o sol num dos extremos do norte do Piauí já castigava. Enquanto ríamos e gravávamos vídeos, inacreditadas com aquela situação, vimos uma placa que dizia que os não-hóspedes deveriam pagar uma taxa de R$ 560 pra usarem as dependências do local.
Saímos imediatamente da piscina e corremos pra recepção pra confirmar com o atendente se o nosso nome estava na lista de hóspedes que fariam o check-in naquele, com medo de, no final, termos que desembolsar R$ 560 cada uma. Com o “sim” dele, voltamos mais aliviadas pra piscina, mas ainda sem acreditar que aquela estrutura toda estava disponível pra gente por R$ 45!
Com a fama que ouvimos que os restaurantes de Barra Grande são caros, voltamos à recepção mais uma vez pedir indicações pro atendente de restaurantes que entregavam marmitas. O rapaz, que havia se mudado pra lá há pouco tempo e estava morando sozinho, foi logo compartilhando uma lista de contatos, com várias dicas e observações de cada um.
Quando as nossas “quentinhas” chegaram, o nosso check-in estava liberado e o atendente nos trouxe uma informação que nos surpreendeu mais uma vez: O quarto compartilhado onde iríamos ficar estava com um problema na fechadura da porta. Por isso, seríamos realocadas para as cabanas.
Ele pediu mil desculpas por aquela situação e, ao lembrar do valor da tarifa que tínhamos pago (os incríveis R$ 45 reais), só conseguia associar a tal “cabana” com barracas de acampamento. Fomos seguindo as indicações da área onde ficavam as cabanas e descobrimos que, na verdade, eram bangalôs particulares!
A estrutura era incrível: havia um chuveiro particular do lado de fora pra cada bangalô, a cabana era ampla e dava até pra ficar de pé do lado de dentro. Tinha ventilador, tapetes, lustres e dois colchões à nossa disposição.
Quando abrimos a portinha da cabana e vimos a estrutura, foi praticamente um surto!!! Pulamos, gritamos, dançamos dentro da cabana, digna de cinema, e dali não queríamos sair mais.
Quando nos acalmamos, enquanto almoçávamos as nossas marmitas, começamos a conversar sobre aquele presente do universo (assim resolvemos chamar esse grato episódio). Yara e eu planejávamos a viagem da Rota das Emoções desde 2019, ano que visitamos – cada uma em meses diferentes – o Maranhão pela primeira vez.
No ano seguinte, veio a pandemia e os planos de todo mundo foram adiados. Em 2021, tínhamos comprado as passagens e feito algumas reservas pra viagem que deveria acontecer no segundo semestre. Só que, em junho daquele ano, minha avó tinha sido diagnosticada com um câncer de intestino e não via mais motivos para cruzar um portão de embarque, deixando a mulher que tanto amo longe dos meus cuidados…
Conseguimos reaver os valores pagos dessa viagem, inclusive as passagens aéreas. No ano seguinte, em 2022, era a minha vez de enfrentar um tratamento de câncer e a Yara estava com planos de se mudar para Austrália. Ou seja, nesse cenário, a nossa ida para visitar os amigos Josiel e Carol no Maranhão e percorrer a Rota das Emoções já era dada como cancelada por nós duas.
Mas, foi ai que o universo nos mostrou mais uma vez que a gente não deveria perder tanto tempo imaginando e tentando prever o futuro… que não adianta a gente se planejar com tanta antecedência, pois não estamos no controle de nada.
Eu respondi muito bem ao tratamento e, em 2023, pude voltar para a minha vida normal. No início daquele ano, era a mãe da Yara que se via na mesma situação – o que fez com ela adiasse seus planos de migração, pra acompanhar a mãe durante o pós cirúrgico pra remover um tumor maligno na mama.
A mãe da Yara teve um tratamento muito rápido e eficaz, antes até mesmo da Yara conseguir reorganizar suas novas passagens pra Austrália. Foi então, que eu fiz o convite pra ela, por uma mensagem de áudio, dizendo que estava me programando pra curtir o São João no Nordeste, voltar ao Maranhão e fazer a Rota das Emoções. Só que aquela viagem, pra mim, não faria sentido sem ela, afinal esse era um sonho nosso!
Não foi preciso muito tempo pra minha amiga de aventuras topar a viagem! E foi nesse momento, antes de terminarmos o almoço, que nos demos conta que tudo acontece como tem que ser, no momento certo. Às vezes, alguns contratempos acontecem, ficamos sem entender o motivo e até chateados pelos planos não seguirem como pensamos.
Mas, os planos que o universo e o destino preparam pra nós são muito melhores e maiores: será que, se tivéssemos ido pra Barra Grande em 2021, a porta do dormitório feminino estaria quebrada e receberíamos um upgrade gratuito pra uma cabana?
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